segunda-feira, 14 de setembro de 2009

SOBRE O DESENHO

O desenho sempre esteve presente na história do desenvolvimento humano, auxiliando no processo de abstração e revelando as idéias visionárias contidas nas mentes de inventores, artistas e demais indivíduos desde nossos ancestrais primitivos.
A arquitetura é uma profissão que está intimamente ligada ao desenho e às artes, na medida em que muitos a considerem a “mãe das artes”. Desta forma o arquiteto busca referências artísticas para o aprimoramento do seu plano de projeto, mas a sua construção é delimitada. Para se utilizar arquitetura em sua plena forma devemos seguir um partido ordenado, detalhes específicos e predeterminados. Por outro lado, na escultura e artes em geral o desenho pode ser o mais livre possível, a fim de conferir caráter único e livre à obra de arte.
Podemos observar a utilização do desenho na escultura. Mesmo se tratando de uma arte espacial, o ato de desenhar confere um caminho, como um grid de controle. Assim não é diferente no desenvolvimento da arquitetura, porém dificilmente podemos comparar desenho arquitetônico e desenho livre artístico, como no caso da escultura ou as artes plásticas.
A arte é livre, porém o desenho é em comum às formas de expressão.
Mais do que uma simples geração de imagem em uma superfície de duas dimensões, a representação de formas existentes ou posteriores, além de ser carregada com um grande teor de intimidade e de emoção, é semelhante a um grande insight contínuo – na verdade uma sucessão deles - que geramos em segundos, relacionando, comparando ou prevendo situações possíveis e/ou até mesmo impossíveis. Ou seja, o desenho é uma representação exteriorizada, na forma de superfície e cor, das imagens preexistentes ou intimamente contidas na mente de quem as produz. É uma exteriorização das formas – concretas ou abstratas – que passa pelo filtro da personalidade do observador. A utilização do recurso de desenho rápido e de essência, consegue nos aproximar desta liberdade artística, quase como uma licença poética de imagem.
Essa captação de imagens serve como recurso externo que nosso intelecto utiliza para aprisionar o partido inicial, uma espécie de imagem estática da idéia inicial. Inúmeras imagens interessantes podem surgir durante o dia, e o desenho básico, rápido e essencial, denominado esboço serve para preservar o instante. Já o posterior desenvolvimento do desenho de esboço, já mais elaborado, chama-se croqui. Ambos podem ser desenvolvidos com diversos materiais de pintura e superfícies de impressão, e possuem o atributo de poderem ser transportados, na maioria das vezes.
Diferentemente da Idade Média, onde o arquiteto deveria permanecer no terreno da obra a fim de desenhar no solo as marcações para a localização exata e os limites da obra, o profissional renascentista fez do esboço e croqui suas ferramentas de extensão no acompanhamento de execução da obra, possibilitando inclusive a sua conclusão pelos olhos de outro arquiteto. Foi nesse período histórico, conhecido como Renascimento, que o profissional de desenho recebeu o reconhecimento de suas técnicas superiores de representação. A descoberta da forma de se representar noção de perspectiva obtida pelo olho humano foi um grande marco na reprodução fiel dos ambientes. Os artistas e arquitetos podiam se valer de seus estudos com uma precisão de projeção futura nunca antes alcançada. Podemos constatar tamanha precisão nas pinturas de artistas da época - como Rafael Sanzio - com planos de fundo bem definidos pontos de fuga centralizados e relação à proporção.
Com a Revolução Francesa e o Iluminismo as regras de desenho arquitetônico ficaram mais rígidas, no inicio dessa época os desenhos de projetos eram praticamente uma colagem de itens contidos na cartilha da Antiguidade Clássica reeditados e dispostos em uma série de ordens e proporções predefinidas, que já não fazia mais sentido para as novas necessidades humanas, além de intimidar o arquiteto no desenvolvimento de sua criatividade imagética e inovação, essenciais atualmente.
Assim no século XX, com um pensamento mais moderno e um desapego aos recursos clássicos, ocorre uma nova investida no poder do esboço como forma de assegurar a primeira revelação, um partido inicial... Nossos meios de representar o que sentimos são lentos demais para captar toda a essência em questão, assim devemos “aprisionar” o ideal o mais rapidamente possível, captando o estado inicial, pois segundo Watelet, discorrendo sobre o esse “princípio de fogo” :
“A mente perde sempre o”fogo” devido a lentidão dos meios que se tem para utilizar...”
Atualmente existe a separação entre projeto final e desenho de estudo com esboço e croqui. Assim é garantidas a evolução do projeto, com diversas técnicas para estruturação de uma idéia, através de imagens.
Não podemos deixar de constatar que até mesmo ao escrever estamos imprimindo nossas letras na forma de superfície e cor, sendo assim também um desenho. Os escritores, artistas, projetistas e demais indivíduos, seguem desenvolvendo suas respectivas técnicas e a adaptando a ação de desenhar às necessidades do cotidiano garantindo a evolução do modo de viver e pensar humano em geral.

REFERÊNCIAS

JANSON, H.W. Iniciação À História da Arte. 2. ed., 1996.
J.M. DE LA PÚERTA EL CROQUIS, PROYECTO Y ARQUITECTURA. 1997

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